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Renata Vilhena Silva é citada na coluna Celso Ming

Renata Vilhena Silva é citada na coluna Celso Ming

Depois de pedido de urgência e seguidos adiamentos, os deputados deixaram para 2018 a votação do projeto de lei que altera as regras dos planos de saúde. Mas o impacto das mudanças vai além do interesse imediato de consumidores e de empresas.

Se o assunto é sistema de saúde suplementar, entram na dança consumidores, médicos, hospitais privados, operadoras de planos de saúde, administradoras e até mesmo o sistema público, o SUS. A Agência Nacional de Saúde (ANS) opera como fiscal do setor para que a coreografia seja respeitada. Mas muita coisa acaba fora do seu controle.

Para o cientista político Marcello Fragano, que analisou o impacto dos grupos de pressão sobre o sistema, a ANS atém-se à microrregulação, como atualização da lista de procedimentos médicos obrigatórios ou suspensão de planos de saúde em caso de irregularidade. “É o Congresso que decide grandes mudanças e é sobre os congressistas que a pressão aumenta.”

Ponto altamente questionado é a redução, prevista pelo relatório, das multas cobradas das operadoras em recusas de atendimento, conflito que frequentemente acaba nos tribunais. Pelos dados do Conselho Nacional de Justiça, em 2016, tramitavam 104 mil processos ligados ao Direito do Consumidor que envolviam planos de saúde. Só no Estado de São Paulo, levantamento do Observatório de Saúde Suplementar da Faculdade de Medicina da USP mostra que de janeiro a setembro de 2017, 23 mil ações foram julgadas pelo Tribunal de Justiça, crescimento de 348,5% em seis anos.

Enquanto a fila de processos cresce, o número de beneficiários diminui. Até junho de 2017, a ANS contabilizou 47,4 milhões de brasileiros com planos de saúde. Em 2014, eram 50 milhões. Boa parte da queda é explicada pela crise. Como 66,4% dos contratos são do tipo coletivo empresarial, o sistema privado de saúde perdeu os clientes que passaram a integrar as estatísticas dos desempregados: 12,7 milhões de brasileiros em outubro.

Outra explicação para a redução é o grande aumento das mensalidades. Ter plano de saúde pesa no bolso. E como! Neste ano, a inflação produzida só por esse item foi de 13,54%, enquanto o custo de vida avançou apenas 2,94%, conforme dados do IBGE. Em 2017, os planos individuais foram reajustados em 13,55%, por determinação da ANS. Sobre as contribuições dos planos coletivos (empresariais ou por adesão) não há teto obrigatório de reajuste. Aumentaram, em média, 15%. Mas dados da ANS mostram casos de até 50%.

Para a Fenasaúde e a Abramge, instituições que representam as operadoras e seus planos, é a atuação da Justiça – na maioria dos casos, com sentença favorável ao consumidor – que eleva os custos, à medida que juízes impõem tratamentos mais caros. Os custos médico-hospitalares por paciente subiram 17,8% de 2015 a 2016.

A especialista em Direito da Saúde Renata Vilhena Silva não vê as decisões judiciais como principal razão da escalada dos preços, mas, sim, a falta de transparência entre planos, hospitais e organizações médicas, que não pormenorizam os custos dos procedimentos.

Outro ponto do relatório que levanta protestos é a proposta defendida pelo ministro da Saúde, Ricardo Barros, de que sejam criados planos de saúde mais baratos, no sentido de que atendam só a alguns dos procedimentos hoje exigidos pela ANS. É ideia aplaudida pelas operadoras, mas repudiada pelos institutos de defesa do consumidor. O ministro argumenta que mensalidades mais populares atrairiam mais clientes e aliviariam o SUS. Mas Renata entende que a estratégia é tiro no pé: “Diante de eventuais recusas de atendimento pelo plano de saúde, o paciente recorrerá ao SUS”. Assim, a segmentação pode significar carga extra para o maior problema do sistema público, ou seja, os tratamentos de alta complexidade, como quimioterapias e transplantes de órgãos.

Como se vê, os conflitos de interesse são enormes e a dificuldade de resolvê-los pode prolongar os debates ao longo de 2018 ou, certamente, até depois.

Fonte: Estadão



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