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Dia Mundial do Consumidor

O que traz felicidade: consumo, saúde ou viver num país bem governado?

Lutemos para que a justiça seja feita e para que possamos ser mais felizes, mas antes de tudo, lutemos para que o Brasil tenha um modelo de política e gestão diferente do que tem hoje. Não há país no mundo com 39 ministérios e onde o prestador de um serviço de saúde ocupe uma pasta que precisa defender o consumidor.

Por: Renata Vilhena Silva

No Dia Mundial do Consumidor, a presidente Dilma promete anunciar medidas de proteção ao consumo que serão novos instrumentos legais para premiar as boas práticas nas relações consumistas e punir as más, reforçando ainda as estruturas já existentes, como os Procons. São louváveis as medidas que beneficiam o consumidor e a iniciativa da presidente, entretanto, elas não terão força alguma enquanto o modelo de gestão brasileiro privilegiar o loteamento de cargos, destinados às agências regulatórias, entre os que apoiaram a candidatura dos políticos.

Há fatos que evidenciam a nomeação de executivos ligados aos planos de Saúde para ocupar postos estratégicos na ANS, Agência Nacional de Saúde Suplementar, que deveria ter isenção para regular e fiscalizar esse mercado, onde as operadoras impõem sua lei e os consumidores pagam caro por um mau serviço. Os cidadãos não querem presentes ou medidas paliativas no Dia Mundial do Consumidor, eles querem ser respeitados todos os dias. 

Uma pesquisa do Instituto Akatu, feita com 800 brasileiros de todas as regiões do país no final de 2012 e publicada nesta semana, revela que – independentemente de fatores como classe social ou faixa etária – os entrevistados associam o conceito de felicidade mais ao bem-estar físico e emocional e à convivência social do que aos aspectos financeiros e à posse de bens.

Chama a atenção que só na pergunta relacionada à saúde, em que as opções eram ter um bom plano de saúde ou ter um estilo de vida mais saudável, houve prevalência da alternativa mais relacionada ao consumo. “A resposta parece revelar não uma preferência pelo modelo consumista, mas sim uma preocupação com a precariedade do sistema de saúde. E, mais ainda, uma atitude que prioriza a segurança, pois a garantia de assistência médica em caso de necessidade vai ao encontro da prioridade dos brasileiros quando pensam em sua felicidade: ter saúde”, explica Helio Mattar, presidente do Instituto.

A organização internacional CI, Consumers International, reuniu, com o apoio do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), e outras 70 organizações de 58 países, os principais problemas dos consumidores no mundo. Esse estudo, realizado entre novembro de 2012 e janeiro de 2013, será parte da contribuição da CI à revisão das Diretrizes da ONU (Organização das Nações Unidas) de Proteção ao Consumidor.

Os resultados demonstram que a defesa do consumidor não tem evoluído de maneira uniforme, satisfatória e apontam, como problemas prioritários, os serviços financeiros, seguidos de saúde e telecomunicações.

Na legislação da maioria dos 58 países está reconhecida a importância da proteção ao consumidor. Em 78% das nações pesquisadas há uma lei geral, porém apenas a metade possui políticas nacionais de proteção. E, apesar de 91% dos países aplicarem multas, somente 55% exigem indenizações. De acordo com matéria publicada pela Folha de S. Paulo, em 11/3, em que analisou 765 processos julgados pela diretoria da ANS entre janeiro e fevereiro, 522 tramitavam havia cinco ou mais anos na agência.

Os outros 243 processos levaram de um a quatro anos para conclusão. Operadoras condenadas ainda podem recorrer à Justiça para escapar das multas que vão de R$ 5.000 a R$ 1 milhão. A demora faz com que punições sejam canceladas e multas reduzidas porque anos depois da abertura do processo, as regras são extintas ou alteradas. O Estado de S. Paulo, em 12/3, afirma que a ANS não recolheu nem 2,5% das multas publicadas no biênio. Elas somam R$ 536,7 milhões, segundo tabela fornecida pelo órgão. Além disso, a Agência não faz, ao SUS, o ressarcimento de suas despesas.

A história da proteção ao consumo é recente no Brasil. Em 1975 foi criado o primeiro organismo privado de defesa do consumidor, a Associação de Proteção ao Consumidor (APC) em Porto Alegre. Dez anos depois, surge o Conselho Nacional de Defesa do Consumidor (CNDC), primeiro órgão em âmbito federal. E, num contexto de abertura política, foi criado o Código de Defesa do Consumidor (CDC) em 1988, que só passou a vigorar em 1991. O PROCON-SP e o IDEC, Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor já tinham sido criados respectivamente em 1976 e 1987. Só em maio de 2012 é que foi criada, pelo decreto 7738, a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) visando coordenar e executar a Política Nacional das Relações de Consumo. 

A Justiça e seus membros têm sido fundamentais para garantir aos consumidores seus direitos, quando eles já esgotaram outros recursos. Não é por acaso que a campanha que celebra mundialmente a defesa dos direitos dos consumidores recebeu o nome de “Justiça para os Consumidores Agora”. Governos do mundo todo iniciaram neste ano o processo de acordos para mudanças nas Diretrizes da ONU sobre a Proteção do Consumidor, revisadas pela última vez, em 1997. Entretanto, de nada adiantarão as medidas dos organismos nacionais e internacionais, além dos esforços de alguns – que atuam como sanitaristas numa área onde regras turvas da não transparência sujam as relações consumistas – se o Governo coloca raposas para tomar conta dos galinheiros. 

Lutemos para que a justiça seja feita e para podermos ser mais felizes, mas antes de tudo, lutemos para que o Brasil tenha um modelo de política e gestão diferente do que tem hoje. Não há país no mundo com 39 ministérios e onde o prestador de um serviço de saúde ocupe uma pasta que precisa defender o consumidor.



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