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Cobrar franquia em planos piora saúde e pune só pacientes

Entidades de defesa dos direitos do consumidor criticam as mudanças estudadas pelo governo para cobrar franquia e coparticipação em consultas e exames. Elas dizem que as empresas estão culpando injustamente os clientes pelos problemas do setor, que o desperdício de recursos precisa ser resolvido pelas próprias operadoras e que as cobranças podem prejudicar a prevenção e o diagnóstico precoce de doenças.

O governo estuda criar regras sobre a oferta de planos de saúde com franquia, de forma semelhante a um seguro de carro. Para usar o plano, o cliente teria que pagar um valor adicional, além das mensalidades. Também seria regulada a coparticipação, que significa pagar uma parte de consultas e exames (vários planos já fazem isso, mas não existe uma regulação formal).

 

Todas as mudanças só valeriam para novos contratos. Os atuais planos não teriam alterações.

 

 

A ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), agência reguladora do setor, e as operadoras de saúde dizem que as regras vão suprir lacunas na legislação, reduzir o valor das mensalidades e diminuir o desperdício de recursos com consultas e exames feitos sem necessidade. As empresas são contra limitar o valor das cobranças e oferecer um pacote mínimo de serviços grátis.

 

Ninguém faz exame só porque quer, diz Idec 

 

Para o Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), é importante que o consumidor tenha consciência dos custos do serviço de saúde, mas ele não é culpado pelo desperdício. O poder do consumidor de acionar os serviços de saúde por iniciativa própria, diz o instituto, é restrito a consultas e a alguns exames. Procedimentos mais caros e internações em hospitais são sempre feitos a pedido do médico.

Ninguém faz um exame, uma tomografia, por exemplo, porque quer. Faz porque o médico pediu, diz Ana Carolina Navarrete, advogada do Idec especializada no setor.

“Quem procura o médico está numa situação de vulnerabilidade porque tem algum problema de saúde e precisa dele. Se o profissional diz que você deve fazer determinado exame, como você pode responder que não? Que conhecimento técnico você tem para recusar?” Ana Carolina Navarrete, advogada do Idec.

Rodrigo Serra Pereira, coordenador do Núcleo Especializado de Defesa do Consumidor da Defensoria Pública do estado de São Paulo, diz que podem existir casos de clientes que fazem exames e consultas sem precisar, mas essa não é a regra. Segundo ele, o “argumento das empresas é só retórico”

“É fácil jogar a culpa na parte mais fraca”, diz. “Mas o problema é outro, pode ser a má gestão das operadoras, por exemplo, ou as relações entre elas, os médicos e os hospitais, que são complexas. Não é o consumidor.”

A necessidade de as operadoras terem uma melhor gestão também é citada pelo advogado Rafael Robba, especialista em direito à saúde. “A utilização indevida dos serviços é um risco ao qual as operadoras estão sujeitas, mas existem outros mecanismos eficazes para diminuir esse gasto, sem ser a cobrança de franquia, como as auditorias, por exemplo”.

 

Prejuízo à prevenção de doenças

 

O Idec e o núcleo da Defensoria afirmam que as cobranças podem ter um efeito negativo na saúde dos beneficiários dos planos de saúde porque eles não deixariam de usar só serviços desnecessários – deixariam de usar tudo. “Isso acaba retardando o diagnóstico de doenças e prejudicando a prevenção”, afirma Pereira.

A ANS diz que as normas vão contemplar um pacote mínimo de consultas e exames isentos de franquia e coparticipação, o que pode evitar ou amenizar o risco para a prevenção. Também deve ser estabelecido um limite mensal e anual no valor da franquia, para “proteger a exposição financeira do beneficiário”, segundo a agência.

As operadoras são contrárias ao limite e ao pacote mínimo por entenderem que o mercado de planos de saúde é capaz de se regular sozinho, com a competição entre as empresas.

Navarrete, do Idec, diz que essa ideia de autorregulação funciona em alguns mercados, mas não no de saúde, devido ao fosso entre o acesso das empresas e dos consumidores à informação. “A assimetria entre o consumidor e o plano de saúde é muito grande. A empresa sabe tudo. Sabe o que está vendendo e sabe quais são os preços de cada procedimento”, diz. “O consumidor não tem o mesmo nível de informação técnica.”

 

Planos podem ser negativos para idosos e doentes crônicos

 

Um ponto positivo das normas em estudo, segundo Pereira e Rafael Robba, é que elas vão criar regras mais claras para práticas que já existem no mercado. Tanto a franquia quanto a coparticipação estão previstas em resolução da ANS desde 1998, mas nunca haviam sido regulamentadas. Embora a franquia, em geral, não seja adotada, a cobrança da coparticipação já acontece em diversos planos.

Caso as novas regras sejam confirmadas, os especialistas orientam o consumidor a obter o máximo de informação possível sobre os custos envolvidos em cada plano oferecido pelas operadoras.

Para idosos e pessoas com doenças crônicas, o cuidado deve ser redobrado, já que a cobrança da franquia e da coparticipação com o uso frequente do plano de saúde pode compensar eventuais quedas nas mensalidades, jogando para cima os gastos totais.

 

Fonte: Portal Uol | Economia



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